segunda-feira, 23 de agosto de 2010

A Mitologia Grega - Aquelau e Hércules.

NENHUMA IMAGEM ENCONTRADA.

O rio-deus Aquelau contou a história de Erisíchton a Teseu e seus companheiros, enquanto os retinha em sua margem hospitaleira, onde tiveram de aguardar que baixassem as águas. Ao terminar a narração, acrescentou: — Por que, porém, contar-vos as transformações de outras pessoas, quando eu próprio sou um exemplo da posse de tal poder? Às vezes, transformo-me em serpente e outras vezes, em um touro, com chifres na cabeça, ou melhor seria dizer que outrora podia fazer tal coisa; agora, só me resta um chifre, pois perdi o outro. E, nesse ponto, deu um gemido e calou-se. Teseu indagou-lhe a causa de seu pesar e como perdera o chifre, ao que o rio-deus respondeu da seguinte forma: — Quem se apraz em contar as próprias derrotas? Não hesitarei, contudo, em relatar a minha, consolando-me com a grandeza do meu vencedor, que foi Hércules. Talvez já tenhais ouvido falar em Dejanira, a mais linda das donzelas, a quem uma multidão de pretendentes procurava conquistar. Eu e Hércules estávamos entre eles, e os demais não se atreveram a competir conosco. Hércules apresentava a seu favor o fato de descender de Jove e seus trabalhos, com os quais fora além das exigências de sua madrasta Juno. Eu, por meu lado, disse ao pai da donzela: "Olha-me, sou o rei das águas que correm através de tuas terras. Não sou estrangeiro, vindo de um litoral distante, mas pertenço ao País, faço parte de teu reino. A real Juno não me tem inimizade nem me castiga com trabalhos pesados. Quanto a esse homem que se proclama filho de Jove, ou é um impostor, ou desgraçado dele se for verdade, por isso será a vergonha para sua mãe." Hércules encarou-me enfurecido e só com muita dificuldade se conteve. "Meu braço responderá melhor que minha língua", disse ele. "Concedo-te a vitória verbal, mas confio minha causa à prova dos fatos." Assim dizendo, investiu contra mim e, depois do que dissera, senti-me envergonhado de recuar. Despi minhas vestes verdes a apresentei-me para a luta. Hércules tratou de atirar-me ao chão, atacando, ora minha cabeça, ora meu corpo. Eu tinha em meu tamanho a proteção e seus ataques foram vãos. Paramos durante algum tempo, depois voltamos à luta. Mantínhamos nossa posição, dispostos a não ceder, disputando passo a passo o terreno, eu curvado sobre ele, apertando sua mão nas minhas, com a testa quase encostada na sua. Por três vezes Hércules tentou atirar-me ao chão e, da quarta vez, conseguiu e cavalgou-me. Eu vos digo a verdade: era como se uma montanha tivesse caído sobre as minhas costas. Lutei para libertar os braços, respirando ofegante e coberto de suor. Hércules não me deu oportunidade de livrar-me e agarrou-me o pescoço. Meus joelhos estavam em terra, minha boca no pó. Compreendendo que não podia competir com ele na arte da guerra, recorri a outros meios e escapei, rastejando, sob a forma de uma serpente. Enrosquei o corpo e silvei, ameaçando o adversário com a língua bipartida. Ele, vendo isso, sorriu, desdenhosamente, e exclamou: "Era trabalho de minha infância, vencer serpentes." Assim dizendo, agarrou-me pelo pescoço. Vencido sob essa forma, tentei a única saída que me restava e transformei-me em touro. Hércules mais uma vez segurou-me pelo pescoço e, encostando minha cabeça no chão, atirou-me à areia. E não se deu por satisfeito. Sua mão implacável arrancou-me o chifre da cabeça. As náiades o recolheram, consagraram-no e encheram-no de flores olorosas. A Fartura tomou-o como seu e chamou-o "Cornucópia". Os antigos compraziam-se em encontrar um sentido oculto em suas lendas mitológicas. Explicam esse combate de Aquelau com Hércules dizendo que o Aquelau era um rio que transbordava de seu leito, na estação chuvosa e, quando a lenda diz que ele amava Dejanira e procurava a ela se unir, isso quer dizer que o rio, em seus meandros, corria através do reino de Dejanira. Dizia-se que tomava a forma de uma serpente por causa de seu curso sinuoso e de um touro pela sua violência e fragor de suas águas. Nas cheias, o rio corria por outro canal. Assim, sua cabeça tinha chifres. Hércules impediu a ocorrência dessas inundações periódicas, por meio de barragens e canais, e foi dito, assim, que vencera o rio-deus e lhe arrancara um chifre. Finalmente, as terras sujeitas à inundação tornaram-se, depois de protegidas, fertilíssimas e isso é explicado pela cornucópia. Há outra versão da origem da cornucópia. Quando nasceu, Júpiter foi entregue por sua mãe, Réia, aos cuidados das filhas de Melisseu, um rei cretense, que alimentaram o deus infante com o leite da cabra Amaltéia. Júpiter quebrou um dos chifres dessa cabra e deu-o às suas amas, atribuindo-lhe o poder mágico de se encher com aquilo que desejasse seu dono. O nome de Amaltéia também é atribuído por alguns autores à mãe de Baco. Assim foi usado por Milton, no Livro IV do Paraíso Perdido:

...Na ilha niseniana,
Pelo Tristão cingida, o velho Cã,
Dos gentios o Amon dos líbios Jove,
Escondeu Amaltéia e o jovem Baco,
Seu filho, da madrasta intolerante.

ADMETO E ALCESTES

Esculápio, filho de Apolo, foi dotado por seu pai de tal habilidade na arte de curar que chegava até a restituir a vida aos mortos. Plutão alarmou-se com isso e conseguiu que Júpiter o fulminasse com um raio. Apolo, indignado com a morte do filho, tratou de vingar-se nos inocentes trabalhadores que haviam construído o raio. Eram os ciclopes, que tinham sua oficina sob o Monte Eta, do qual estão constantemente saindo as chamas e a fumaça provindas daquela oficina. Apolo desfechou suas setas contra os ciclopes, o que irritou Júpiter a tal ponto que o condenou a tornar-se servo de um mortal, durante um ano. Assim, Apolo foi servir a Admeto, Rei da Tessália, tomando conta de seus rebanhos, nas verdejantes margens do Rio Afrisos. Admeto era um dos pretendentes à mão de Alcestes, filha de Pélias, que a prometera àquele que a fosse procurar num carro puxado por leões e javalis. Admeto executou uma tarefa, com a ajuda de seu divino pastor, e foi premiado com Alcestes. Admeto, porém, adoeceu e, estando às portas da morte, Apolo conseguiu que as Parcas o poupassem, com a condição de que alguém se dispusesse a morrer em seu lugar. Muito alegre com essa esperança, Admeto não se preocupou muito com o resgate, talvez se lembrando dos protestos de dedicação que ouvira muitas vezes da boca dos cortesãos e dos servos. Pensou que seria muito fácil encontrar um substituto. Tal não se deu, porém. Guerreiros valentes, que, de boa vontade, arriscavam a vida por seu príncipe, recuavam ante a idéia de morrer por ele num leito de enfermo, e os servos que lhe deviam benefícios e que se encontravam a serviço de sua casa desde a infância não se dispunham a sacrificar os poucos dias que lhes restavam para mostrar sua gratidão. "Por que um de seus pais não se sacrifica?" perguntavam. "De acordo com as leis da natureza, eles não poderão viver muito mais e quem estará mais indicado que eles para resgatar uma vida a que deram origem?" Os pais, contudo, por mais pesarosos que estivessem ante a iminência de perder o filho, não atendiam ao apelo para salvá-lo. Então, Alcestes, com admirável abnegação, ofereceu-se como substituta. Admeto, por mais amor que tivesse à vida, não desejava mantê-la a tal custo, mas não havia remédio. A condição imposta pelas Parcas fora satisfeita e o decreto era irrevogável. Alcestes adoeceu, ao passo que Admeto se restabelecia, e aproximava-se rapidamente da sepultura. Justamente nessa ocasião, Hércules chegou ao Palácio de Admeto e encontrou todos os moradores pesarosíssimos, ante a iminência da morte da dedicada esposa e querida senhora. Hércules, para quem não havia trabalho bastante árduo, resolveu tentar salvar a rainha. Ficou na porta do seu quarto e, quando a Morte chegou à procura de sua presa, agarrou-a e obrigou-a a desistir de sua vítima. Alcestes restabeleceu-se e foi restituída ao marido.

Milton faz alusão a Alcestes em seu "Soneto sobre a esposa morta":

Tive a impressão de ver minha esposa querida
Voltando a consolar a minha desventura,
Como Alcestes também roubada a sepultura
Pelo filho de Jove, pálida e abatida

ANTÍGONA.

O sexo feminino desempenha importante papel na mitologia grega, quer quanto ao número de personalidades interessantes, quer pelo valor dos atos praticados. Antígona foi um exemplo tão belo de amor filial e fraternal quanto Alcestes de amor conjugai. Era filha de Édipo e Jocasta, que, com todos os seus descendentes, foram vítimas de um destino inelutável, que os condenou à destruição. Em seus acessos de loucura, Édipo arrancara os olhos e foi expulso de seu reino, Tebas, temido e abandonado por todos os homens, como objeto da vingança dos deuses. Antígona, sua filha, compartilhou sozinha de suas peregrinações e ficou com ele até sua morte, regressando, então, a Tebas. Seus irmãos, Etéocles e Polinice, haviam combinado dividir o reino entre si e reinarem alternadamente, cada um durante um ano. O primeiro ano coube a Etéocles, que, quando expirou o prazo, negou-se a entregar o reino ao irmão. Polinice fugiu para junto de Adrastos, Rei de Argos, que lhe deu sua filha em casamento e ajudou-o, com um exército, a sustentar sua pretensão ao trono. Isso acarretou a famosa expedição dos "Sete Contra Tebas", que deu muito assunto aos poetas épicos e trágicos da Grécia. Anfiarus, cunhado de Adrastos, opôs-se à empresa, pois era vidente e sabia, graças à sua arte, que nenhum dos chefes, com exceção de Adrastos, voltaria vivo. Contudo, Anfiarus, quando se casara com Erifila, irmã do rei, concordara que qualquer divergência surgida entre ele e Adrastos seria resolvida por Erifila. Sabendo disso, Polinice deu a Erifila o colar de Harmonia, conquistando-a, desse modo, para a sua causa. Esse colar fora um presente que Vulcano oferecera a Harmonia, quando essa se casou com Cadmo, e Polinice levara-o consigo, ao fugir de Tebas. Erifila não pôde resistir à tentação do suborno e, graças à sua decisão, a guerra se tornou inevitável e Anfiarus foi condenado a um destino fatal. Ele participou valentemente da luta, mas não pôde evitar a fatalidade de seu destino. Perseguido pelo inimigo, fugia ao longo do rio quando um raio lançado por Júpiter abriu a terra e ele, seu carro e o cocheiro foram tragados. Não haveria espaço aqui para descrever todos os atos de heroísmo ou atrocidade que assinalaram a luta; não devemos, contudo, omitir a fidelidade de Evadne, em contraste com a fraqueza de Erifila. Capaneu, marido de Evadne, no ardor do combate, afirmou que abriria caminho até a cidade, a despeito do próprio Jove. Encostou uma escada na muralha e subiu, mas Júpiter, ofendido com suas palavras impiedosas, fulminou-o com um raio. Quando seu funeral foi celebrado, Evadne atirou-se à pira e morreu. No começo da luta, Etéocles consultou o adivinho Tirésias sobre o seu desenrolar (Tirésias, em sua juventude, vira, por acaso, Minerva se banhando. Furiosa, a deusa privou-o da visão, porém mais tarde, abrandando-se, concedeu-lhe, como compensação, o conhecimento dos acontecimentos futuros), que declarou que a vitória caberia a Tebas, se Menoceu, filho de Créon, se oferecesse como vítima voluntária. Ao saber disso, o heróico jovem sacrificou a vida, no primeiro encontro. O sítio continuou, com alternativas de vitórias e derrotas para os dois lados. Finalmente, concordou-se que os irmãos decidissem a disputa em um combate singular. Os dois lutaram e ambos morreram. Os exércitos, então, reiniciaram a luta e afinal os invasores foram obrigados a ceder e fugiram, deixando seus mortos insepultos. Créon, tio dos dois príncipes mortos, tornou-se rei e mandou enterrar Etéocles com todas as honras, mas deixou o corpo de Polinice onde caíra, proibindo, sob pena de morte, que alguém o enterrasse. Antígona, a irmã de Polinice, ficou indignada, ao ter notícia do revoltante edito que entregara o corpo do irmão aos cães e aos abutres, privando-o dos ritos que eram considerados essenciais ao repouso dos mortos. Sem se deixar abalar pelos conselhos de uma irmã afetuosa, mas tímida, resolveu desafiar a sorte e enterrar o corpo com suas próprias mãos. Foi presa enquanto fazia isso e Créon deu ordens para que a enterrassem viva por haver desobedecido deliberadamente um edito solene da cidade. Seu amante, Hêmon, filho de Créon, incapaz de salvá-la, não lhe sobreviveu, suicidando-se. Antígona é assunto de duas belas tragédias do poeta grego Sófocles. A Sra. Jameson, no livro Caracteres das Mulheres, compara seu caráter ao de Cordélia, do Rei Lear, de Shakespeare. A seguinte passagem de Sófocles refere-se às lamentações de Antígona, quando a morte afinal livra Édipo de seus sofrimentos:

Como haveria de querer a vida?
O próprio sofrimento menos duro
Era ao seu lado. O que era insuportável
Junto dele eu teria tolerado.
Oh meu querido pai! Na sepultura
Como estás e tão velho como estavas,
Quero-te ainda e hei de querer-te sempre.

PENÉLOPE

Penélope é outra dessas heroínas míticas, cuja beleza é mais do caráter e da conduta que do corpo. Era filha de Icário, um príncipe espartano. Ulisses, Rei de Itaca, pediu-a em casamento e conquistou-a, entre todos os competidores. Quando chegou o momento em que a jovem esposa deveria deixar a casa paterna, Icário, não tolerando a idéia de separar-se da filha, tentou persuadi-la a permanecer ao seu lado e não acompanhar o marido a Itaca. Ulisses deixou a Penélope o critério da escolha e ela, em vez de responder, baixou o véu sobre o rosto. Icário não insistiu, mas, quando ela partiu, levantou uma estátua do Pudor no lugar onde se haviam separado. Ulisses e Penélope não haviam gozado sua união por mais de um ano, quando tiveram de interrompê-la, em virtude dos acontecimentos que levaram Ulisses à Guerra de Tróia. Durante sua longa ausência, e quando era duvidoso que ele ainda vivesse, e muito improvável que regressasse, Penélope foi importunada por inúmeros pretendentes, dos quais parecia não poder livrar-se senão escolhendo um deles para esposo. Penélope, contudo, lançou mão de todos os artifícios para ganhar tempo, ainda esperançosa no regresso de Ulisses. Um desses artifícios foi o de alegar que estava empenhada em tecer uma tela para o dossel funerário de Laertes, pai de seu marido, comprometendo-se em fazer sua escolha entre os pretendentes quando a obra estivesse pronta. Durante o dia, trabalhava nela, mas, à noite, desfazia o trabalho feito. E a famosa tela de Penélope, que passou a ser uma expressão proverbial, para designar qualquer coisa que está sempre sendo feita mas não se acaba de fazer. O resto da história de Penélope será contado quando narrarmos as aventuras de seu marido.

A Mitologia Grega - As Divindades Aquáticas.




Oceano e Tétis eram os titãs que governavam os elementos líquidos. Quando Jove e seus irmãos derrotaram os titãs e assumiram seu poder, Netuno e Anfitrite sucederam-se a Oceano e Tétis no domínio das águas.

NETUNO

Netuno era a principal das divindades da água. O símbolo do seu poder era o tridente, ou lança de três pontas, que usava para abalar os rochedos, desencadear ou amainar as tempestades, sacudir as costas e outras coisas semelhantes. Criou o cavalo e era o padroeiro das corridas eqüestres. Seus próprios cavalos tinham patas de bronze e crinas de ouro. Puxavam seu carro sobre o mar, que se acalmava diante do deus, enquanto os monstros das profundidades brincavam em seu caminho.

ANFITRITE

Anfitrite era esposa de Netuno, filha de Nereu e Dóris e mãe de Tritão. Para fazer a corte a Anfitrite, Netuno cavalgava um delfim, que foi colocado pelo deus entre as estrelas, quando conquistou o amor da deusa.

NEREU E DÓRIS

Nereu e Dóris eram os pais das Nereidas, as mais celebradas das quais foram Anfitrite, Tétis, mãe de Aquiles, e Galatéia, que foi amada pelo ciclope Polifemo. Nereu distinguia-se por sua sabedoria e por seu amor pela verdade e pela justiça, pelo que era chamado sábio. Também possuía o dom da profecia.

TRITÃO E PROTEU

Tritão era filho de Netuno e Anfitrite e os poetas o apresentavam como trombeteiro de seu pai. Também Proteu era filho de Netuno. Como Nereu, era considerado um sábio do mar por sua sabedoria e conhecimento dos acontecimentos futuros. Tinha o poder peculiar de mudar à vontade sua forma.

TÉTIS

Tétis, filha de Nereu e Dóris, era tão bela que o próprio Júpiter desejou desposá-la; tendo porém sabido pelo titã Prometeu que Tétis teria um filho maior que seu pai, Júpiter desistiu da idéia e determinou que Tétis fosse esposa de um mortal. Com a ajuda do centauro Quíron, Peleu conseguiu desposar a deusa e seu filho foi o renomado Aquiles. No capítulo em que tratarmos da Guerra de Tróia veremos que Tétis foi mãe dedicada, ajudando o filho em todas as suas dificuldades e velando por todos os seus interesses.

LEUCOTÉIA E PALÊMON

Ino, filha de Cadmo e esposa de Atamas, fugindo de seu furioso marido, com o filhinho Melicertes nos braços, caiu de um rochedo no mar. Os deuses, compadecidos, transformaram-na numa deusa marinha, com o nome de Leucotéia, e ao filho em um deus, com o nome de Palêmon. Ambos tinham o poder de salvar os homens de naufrágios e eram invocados pelos marinheiros. Palêmon geralmente era representado cavalgando um golfinho. Os Jogos Ístmicos eram celebrados em sua honra. Era chamado Portuno pelos romanos, e acreditava-se que governava os portos e as costas. Milton faz alusão a essas divindades, na última canção do "Comuns":

Atende, ninfa, o ardor que me consome.
Escuta e surge, do Oceano em nome.
Peço-te, ninfa, em nome de Nereu
Taciturno e de Tétis majestosa
E em nome das malícias de Proteu.
De Tristão pela concha sinuosa,
De Glauco pelas suas profecias,
De Leucotéia pelas mãos macias etc.

Armstrong, o poeta da "Arte de Conservar a Saúde", sob a inspiração de Higéia, deusa da Saúde, assim celebra as náiades:

A caminho da fonte vinde, Náiades!
Donzelas venturosas! Vossas prendas
Exaltar e cantar cumpre-me agora
(Assim Péon ordena, assim ordenam
Da saúde os princípios poderosos)
Exaltar vossas águas cristalinas,
O regatos gentis! Em vosso seio
Vida nova se bebe, quando matam
A sede as mãos em concha e os lábios secos.

Péon é um nome pelo qual são chamados tanto Apolo como Esculápio.

AS CAMENAS

Por este nome os latinos chamavam as Musas, mas incluindo, também, outras divindades, principalmente ninfas dos montes. Egéria era uma delas, e sua fonte e sua gruta ainda são mostradas até hoje. Conta-se que Numa, segundo Rei de Roma, era favorecido por essa ninfa com encontros secretos, durante os quais ela lhe dava lições de sabedoria e direito, que foram concretizadas nas instituições da jovem nação. Depois da morte de Numa, a ninfa definhou de pesar e transformou-se numa fonte.

OS VENTOS

Quando tantas forças menos ativas da natureza eram personificadas, não é de se admirar que os ventos o fossem. Eram: o Bóreas ou Aquilão, o vento norte; Zéfiro ou Favônio, o vento oeste; Nótus ou Áuster, o vento sul, e Euro, o vento leste. Os dois primeiros principalmente têm sido celebrados pelos poetas, o Aquilão pela sua rudeza e o Zéfiro pela sua doçura. Bóreas amava a ninfa Orítia, mas não conseguiu grande êxito como amante. Era-lhe difícil respirar delicadamente e suspirar estava, para ele, fora de cogitação. Cansado de tentativas inúteis, mostrou seu verdadeiro caráter, raptando a donzela. Foram seus filhos Zetes e Calais, guerreiros alados, que acompanharam a expedição dos Argonautas e prestaram bons serviços, no encontro com as aves monstruosas, as harpias. Zéfiro era amante de Flora. Milton faz alusão aos dois no Paraíso Perdido, quando descreve Adão, desperto, contemplando Eva, ainda adormecida:

... Erguendo-se de lado,
Inclinando-se um pouco, contemplou-a:
Desperta ou adormecida, a companheira
Pela sua beleza o dominava.
E chamou-a, então, com voz suave,
Como a de Zéfiro, quando Flora chama.
Tocando-lhe de leve, diz: "Acorda,
Minha esposa gentil, do Paraíso
Dom precioso, cada vez mais belo"


A Mitologia Grega - Reco.

NENHUMA IMAGEM ENCONTRADA.

As Hamadríades sabiam apreciar os serviços que lhes eram prestados tão bem quanto castigar as injúrias. A história de Reco é uma prova disto. Vendo um dia um carvalho que estava prestes a cair, Reco ordenou aos seus servos que o escorassem. A ninfa, que estava na iminência de morrer com a árvore, apareceu a Reco, exprimindo sua gratidão por ele ter lhe salvo a vida e pedindo-lhe para dizer que recompensa desejava. Ousadamente, Reco pediu seu amor e a ninfa curvou-se ao seu desejo. Ao mesmo tempo aconselhou-o a ser fiel e lhe disse que lhe enviaria uma abelha como mensageira, sempre que o admitisse em sua companhia. Certa vez, a abelha foi procurar Reco quando este estava jogando dados e, descuidadamente, ele afugentou o inseto. A ninfa irritou-se tanto que nunca mais permitiu que ele a visse.

A Mitologia Grega - Erishíchton.

NENHUMA IMAGEM ENCONTRADA.

Erisíchton era um homem grosseiro, que desprezava os deuses. Certa ocasião, resolveu profanar com o machado um bosque consagrado a Ceres. Ali erguia-se um venerável carvalho, tão grande que ele sozinho dava a impressão de uma floresta inteira. Em seu velho tronco, que dominava as outras árvores, freqüentemente eram colocadas guirlandas votivas e entalhadas inscrições manifestando gratidão à ninfa da árvore. Muitas vezes tinham as dríades dançado de mãos dadas em torno do carvalho. Seu tronco media quinze côvados de circunferência1 e sobrepujava as outras árvores como estas sobrepujavam os arbustos. Erisíchton, contudo, não viu motivos para poupá-lo e ordenou a seus servos que o cortassem. Ao vê-los hesitantes, arrebatou o machado das mãos de um deles e exclamou, impiedosamente: — Não quero saber se esta árvore é ou não amada pela deusa. Fosse ela própria uma deusa e eu a abateria se se interpusesse em meu caminho. Assim dizendo, ergueu o machado e o carvalho pareceu estremecer e dar um gemido. Quando a primeira machadada o atingiu, o tronco começou a deitar sangue pela ferida. Todos os circunstantes ficaram horrorizados e um deles aventurou-se a censurar e segurar o machado fatal. Com olhar de desprezo Erisíchton disse-lhe: — Recebe a recompensa de tua piedade! E voltou contra ele a arma que afastara da árvore, crivou-lhe o corpo de ferimentos e cortou-lhe a cabeça. Do meio do carvalho, veio então uma voz: — Eu que moro nesta árvore sou uma ninfa amada de Ceres e, morrendo por tuas mãos, predigo que o castigo te aguarda. Erisíchton não desistiu de seu crime e afinal a árvore, atingida por repetidos golpes e puxada por cordas, caiu com estrondo e esmagou sob o seu peso grande parte do bosque. As dríades, muito tristes com a morte de sua companheira e sentindo ultrajado o orgulho da floresta, dirigiram-se a Ceres, vestidas de luto e pediram que Erisíchton fosse castigado. A deusa acedeu ao pedido e, ao curvar a cabeça, também se inclinaram todas as espigas maduras para a colheita. Imaginou um castigo tão cruel que despertaria piedade, se acaso tal malvado merecesse piedade: entregá-lo à Fome. Como a própria Ceres não podia aproximar-se da Fome, pois as Parcas haviam ordenado que essas duas deusas jamais se encontrassem, chamou uma Oréade da montanha e assim lhe falou: — Há, na parte mais longínqua da gelada Cítia, uma região triste e estéril, sem árvores e sem campos cultivados. Ali moram o Frio, o Medo, o Tremor e a Fome. Vai àquela região e dize à última para tomar posse das entranhas de Erisíchton. Que a abundância não a vença, nem o poder de meus dons a afaste. Não te assustes com a distância — (pois a Fome mora muito longe de Ceres) —, mas toma meu carro; os dragões estão atrelados e são obedientes, e levar-te-ão através dos ares, em pouco tempo. Assim, a ninfa partiu e em breve atingiu a Cítia. Chegando ao Monte Cáucaso, parou os dragões e encontrou a Fome num campo pedregoso, arrancando a escassa erva com os dentes e as garras. Tinha os cabelos hirsutos, os olhos fundos, as faces pálidas, os lábios descorados, a boca coberta de poeira e a pele distendida, mostrando todos os ossos. Olhando-a de longe (pois não se atrevia a aproximar-se), a Oréade transmitiu as ordens de Ceres. E embora se tivesse detido o menor tempo possível e se mantido à maior distância que pôde, começou a sentir fome, e voltou à Tessália. A Fome obedeceu às ordens de Ceres e, avançando velozmente pelos ares até à morada de Erisíchton, entrou no quarto do criminoso, que encontrou adormecido. Envolveu-o com suas asas e penetrou ela própria pela sua respiração, destilando veneno por suas veias. Tendo executado sua missão, apressou-se em deixar a terra da fartura e voltou à sua costumeira desolação. Erisíchton ainda dormia, e em seus sonhos, ansiava por alimentos e movia a mandíbula, como se estivesse comendo. Ao acordar, a fome o devorava. A todo momento queria ter diante de si iguarias de qualquer espécie que produzissem a terra, o mar ou o ar, e queixava-se de fome, mesmo enquanto comia. Não lhe era suficiente o que teria sido bastante para uma cidade ou uma nação. Quanto mais comia, maior era sua fome. Era uma fome semelhante ao mar, que recebe todos os rios e, no entanto, não se enche, ou como o fogo que consome todo o combustível que tem junto de si e continua pronto a destruir outros. Seus bens diminuíram rapidamente em face das incessantes exigências de seu apetite, mas a fome continuava insaciada. Afinal gastou tudo o que tinha e restou-lhe apenas uma filha, uma filha que merecia um pai melhor. Vendeu-a também. Desesperada de ser escrava do comprador, a jovem, de pé junto ao mar, ergueu os braços, numa prece a Netuno. O deus ouviu suas súplicas e embora seu novo senhor não estivesse longe e a visse um momento antes, Netuno mudou-lhe a forma e fê-la assumir a de um pescador entregue à sua ocupação. Procurando-a, e vendo-a sob aquela nova forma, seu dono perguntou-lhe: — Bom pescador, aonde foi a donzela que vi agora mesmo, com os cabelos despenteados e pobremente vestida, de pé junto deste lugar onde estás? Dize-me a verdade e tua sorte será boa e nenhum peixe morderá hoje a isca e fugirá. A jovem percebeu que sua prece fora atendida e regozijou-se, intimamente, ao ver-se interrogada a respeito de si mesma. — Perdoa-me estrangeiro — respondeu —, mas estava tão ocupado com meu caniço e minha linha que nada vi. Possa eu contudo jamais pescar outro peixe se acredito que esteve por aqui, ainda há pouco, alguma mulher ou outra pessoa qualquer. O homem iludiu-se e continuou seu caminho, pensando que sua escrava fugira. Ela, então, reassumiu a forma. Seu pai ficou satisfeitíssimo ao vê-la ainda consigo, juntamente com o dinheiro resultante de sua venda; e tratou de vendê-la outra vez. A jovem, contudo, graças a Netuno, transformou-se tantas vezes quanto as que fora vendida; ora em um cavalo, ora em uma ave, ora em um boi, ora em um cervo. Assim, livrava-se dos compradores e voltava para casa. Por esse meio, o faminto pai conseguia alimento, mas não o suficiente para as suas necessidades, e, afinal, a fome o obrigou a devorar seus próprios membros e procurou destruir o corpo para alimentar esse mesmo corpo, até que a morte o libertou da vingança de Ceres.

A Mitologia Grega - As Divindades Rurais.



Pã, o deus dos bosques e dos campos, dos rebanhos e dos pastores, morava em grutas, vagava pelas montanhas e pelos vales e divertia-se caçando ou dirigindo as danças das ninfas. Era amante da música e, como vimos, o inventor da sírinx, ou avena, e que tocava magistralmente. Pã, como os outros deuses que habitavam as florestas, era temido por aqueles cujas ocupações os obrigavam a atravessar as matas durante a noite, pois as trevas e a solidão que reinavam em tais lugares predispunham os espíritos aos temores supersticiosos. Por isso, os pavores súbitos, desprovidos de qualquer causa aparente, eram atribuídos a Pã e chamados de terror pânico ou simplesmente de pânico. Como o nome do deus significa tudo, Pã passou a ser considerado símbolo do universo e personificação da natureza, e mais tarde, enfim, foi olhado como representante de todos os deuses e do próprio paganismo. Silvano e Fauno eram divindades latinas, cujas características são a tal ponto semelhantes às de Pã, que podem ser consideradas como a mesma personagem, sob nomes diferentes. As ninfas dos bosques, companheiras de Pã nas danças, constituíam apenas uma das classes das ninfas. Havia, além delas, as Náiades, que governavam os regatos e as fontes; as Oréades, ninfas das montanhas e grutas, e as Nereidas, ninfas do mar. As três últimas eram imortais, mas as ninfas dos bosques, chamadas Dríades ou Hamadríades, morriam, segundo se acreditava, com as árvores que lhes serviam de morada e juntamente com as quais nasciam. Constituía, portanto, uma impiedade destruir uma árvore e, em alguns casos graves, tal ato era severamente punido, como se deu no caso de Erisíchton, que relembraremos daqui a pouco. Milton, em sua bela descrição dos primórdios da criação, assim se refere a Pã, como personificação da natureza:

... o Pã universal,
Dançando junto às Graças e às Horas,
Comanda a sempiterna primavera.

E descrevendo a morada de Eva:

Em mais sombreado e protegido abrigo
Pã ou Silvano não dormiram, e as ninfas
E os faunos outro igual não visitaram.
Paraíso Perdido, Livro IV

Um aspecto sedutor do paganismo era o de creditar à iniciativa de uma divindade cada fenômeno da natureza. A imaginação dos gregos povoava todas as regiões da terra e do mar de divindades, a cuja diligência atribuíam os fenômenos que nossa filosofia considera como conseqüência das leis naturais. Às vezes, em nossos momentos de poesia, sentimo-nos inclinados a lamentar a mudança ocorrida, e a achar que, com a substituição, o coração perdeu tanto quanto o cérebro ganhou. O poeta Wordsworth manifesta, de maneira bem enérgica, tal sentimento.

Oxalá um pagão ainda eu fosse,
Por velhas ilusões acalentado.
A paisagem seria bem mais doce
E o mundo muito menos desolado.

Schiller, no poema "Die Götter Griechenlands", manifesta seu pesar pelo desaparecimento da bela mitologia dos velhos tempos, o que provocou uma resposta da poetisa cristã E. Barrett Browning, no poema "Pã é Morto", do qual fazem parte as duas seguintes estrofes:

Pela tua beleza que se curva
Ante maior Beleza que te vence,
Pelo nosso valor adivinhando
Entre tuas mentiras a Verdade,
Não te choramos! Dar-nos-á o mundo,
Depois do velho reino, outro reinado.
Pã é morto!

O mundo deixa além as fantasias
Que, em sua juventude, o embalaram
E as fábulas mais belas e mais vivas
Tolas parecem em face da verdade.
De Febo o carro terminou o curso!
Olhai de f ente o sol, olhai, poetas!
E Pã, e Pã é morto.

Estes versos baseiam-se numa velha tradição cristã, segundo a qual, quando o anjo avisou os pastores de Belém do nascimento de Cristo, um gemido profundo, ouvido através de toda a Grécia, anunciou que o grande Pã morrera e toda a realeza do Olimpo fora destronada, passando as divindades a vagar no frio e nas trevas. E o que Milton conta no "Hino à Natividade":

Pelas praias, além, pelas montanhas,
Triste como um gemido, ecoa um grito.
Por vales verdejantes, entre as folhas,
O gênio antigo suspirando foge,
Choram as ninfas nos bosques desoladas.

sábado, 14 de agosto de 2010

A Mitologia Grega - Castor e Pólux.


Castor e Pólux eram filhos de Leda e do cisne sob cujo disfarce Júpiter se escondeu. Leda deu nascimento a um ovo, que produziu os dois gêmeos. Helena, tão famosa devido à Guerra de Tróia, era sua irmã. Quando Teseu e seu amigo Pírito raptaram Helena, em Esparta, os jovens heróis Castor e Pólux saíram, imediatamente, com seus sequazes para libertá-la. Teseu não se encontrava na Ática e os gêmeos recuperaram a irmã. Castor era famoso como domador de cavalos e cavaleiro e Pólux, como lutador. Eram unidos por ardente afeição e inseparáveis em todos os seus feitos. Acompanharam a expedição dos Argonautas. Durante a viagem, irrompeu uma tempestade e Orfeu invocou os deuses da Samotrácia, tocando sua harpa. A tempestade cessou, então, e apareceram estrelas sobre a cabeça dos gêmeos. Devido a isso, Castor e Pólux passaram depois a ser considerados as divindades protetoras dos marinheiros e viajantes, e as chamas que, conforme o estado da atmosfera, costumam aparecer em torno das velas e dos mastros das embarcações receberam seus nomes. Depois da expedição dos Argonautas, encontramos Castor e Pólux empenhados numa guerra com Idas e Linceus. Castor foi morto e Pólux, inconsolável com a perda do irmão, pediu a Júpiter que lhe permitisse oferecer a sua própria vida pela do outro. Júpiter consentiu que os dois irmãos vivessem alternadamente, passando um dia na terra e outro na morada celestial. Segundo outra versão, Júpiter recompensou a afeição dos irmãos, colocando-os entre as estrelas, como Gemini, os Gêmeos. Os dois receberam honras divinas sob o nome de Dioscuros (filhos de Jove). Acreditava-se que apareciam, às vezes mais tarde, participando de combates, de um ou outro lado, cavalgando magníficos cavalos brancos. Na história dos primeiros tempos de Roma, por exemplo, dizia-se que eles ajudaram os romanos na batalha do Lago Regilo, e, depois da vitória, foi erguido um templo em sua honra, no local onde apareceram.
Macaulay, em seus "Cantos da Roma Antiga", assim se refere à lenda:

Tão semelhantes eram, que os mortais
Um do outro jamais distinguiriam.
Tinham armaduras brancas como a neve
E brancos como a neve os seus corcéis.
Jamais forjas terrenas fabricaram
Tão brilhante armadura, ou em terrena
Fonte a sede matou corcel tão belo.
Volta em triunfo o chefe, que nas provas
Incertas do combate sempre vira
O calor dos irmãos inseparáveis.
Volta o navio ao porto, em segurança,
Desafiando o mar e as tempestades
Que a bordo estavam os poderosos gêmeos.

A Mitologia Grega - Dédalo.


O labirinto do qual Teseu escapou, graças ao fio de Ariadne, fora construído por Dédalo, um artífice habilidosíssimo. Era um edifício com inúmeros corredores tortuosos que davam uns para os outros e que pareciam não ter começo nem fim, como o Rio Meandro, que volta sobre si mesmo e ora segue para adiante, ora para trás, em seu curso para o mar. Dédalo construiu o labirinto para Minos, mas, depois, caiu no desagrado do rei e foi aprisionado em uma torre. Conseguiu fugir da prisão, mas não podia sair da ilha por mar, pois o rei mantinha severa vigilância sobre todos os barcos que partiam e não permitia que nenhuma embarcação zarpasse antes de rigorosamente revistada. "Minos pode vigiar a terra e o mar, mas não o ar" — disse Dédalo. "Tentarei esse caminho". Pôs-se, então, a fabricar asas para si mesmo e para seu jovem filho, Ícaro. Uniu as penas, começando das menores e acrescentando as maiores, de modo a formar uma superfície crescente. Prendeu as penas maiores com fios e as menores com cera e deu ao conjunto uma curvatura delicada, como as asas das aves. O menino Ícaro, de pé, ao seu lado, contemplava o trabalho, ora correndo para ir apanhar as penas que o vento levava, ora modelando a cera com os dedos e prejudicando, com seus folguedos, o trabalho do pai. Quando, afinal, o trabalho foi terminado, o artista, agitando as asas, viu-se flutuando e equilibrando-se no ar. Em seguida, equipou o filho da mesma maneira e ensinou-o a voar, como a ave ensina ao filhote, lançando-o ao ar, do elevado ninho. — Ícaro, meu filho — disse, quando tudo ficou pronto para o vôo —, recomendo-te que voes a uma altura moderada, pois, se voares muito baixo, a umidade emperrará tuas asas e, se voares muito alto, o calor as derreterá. Conserva-te perto de mim e estarás em segurança.
Enquanto dava essas instruções e ajustava as asas aos ombros do filho, Dédalo tinha o rosto coberto de lágrimas e suas mãos tremiam. Beijou o menino, sem saber que era pela última vez, depois, elevando-se em suas asas, voou, encorajando o filho a fazer o mesmo e olhando para trás, a fim de ver como o menino manejava as asas. Ao ver os dois voarem, o lavrador parava o trabalho para contemplá-los e o pastor apoiava-se no cajado, voltando os olhos para o ar, atônitos ante o que viam, e julgando que eram deuses aqueles que conseguiam cortar o ar de tal modo. Os dois haviam deixado Samos e Delos à esquerda e Lebintos à direita, quando o rapazinho, exultante com o vôo, começou a abandonar a direção do companheiro e a elevar-se para alcançar o céu. A proximidade do ardente sol amoleceu a cera que prendia as penas e estas desprenderam-se. O jovem agitava os braços, mas já não havia penas para sustentá-lo no ar. Lançando gritos dirigidos ao pai, mergulhou nas águas azuis do mar que, daquele dia em diante, recebeu o seu nome. — Ícaro, Ícaro, onde estás? — gritou o pai. Afinal, viu as penas flutuando na água e, amargamente, lamentando a própria arte, enterrou o corpo e denominou a região Icária, em memória do filho. Dédalo chegou são e salvo à Sicília, onde ergueu um templo a Apolo, lá depositando as asas, que ofereceu ao deus. Dédalo tinha tanta vaidade com suas realizações, que não tolerava a idéia de um rival. Sua irmã entregou aos seus cuidados um filho, Pérdix, a fim de aprender as artes mecânicas. O jovem era um bom aluno e deu provas de notável habilidade. Caminhando, certa vez, na praia, encontrou uma espinha de peixe. Imitou-a com um pedaço de ferro, que chanfrou na borda, inventando, assim, a serra. Uniu dois pedaços de ferro, prendendo-os na extremidade com um rebite e aguçando as duas outras extremidades, e construiu um compasso. Dédalo teve tanta inveja das invenções do sobrinho que, quando os dois se encontravam juntos, certo dia, no alto de uma torre muito elevada, atirou-o para fora. Minerva, que protege a habilidade, viu-o cair e evitou sua morte, transformando-o numa ave, que recebeu seu nome, a perdiz. Essa ave não constrói seu ninho nas árvores nem voa alto, acomodando-se nas sebes e, lembrando-se da queda, evita os lugares elevados.